domingo, 28 de agosto de 2011

O CORNO





Ele entrou na salinha e sentou na poltrona que estava à minha frente. Estava atordoado. Só deu tempo de dizer a ele “boa tarde”.

“Boa tarde”. Respondeu. O rapaz nem deu uma pausa e já foi logo despejando:
“Sabe eu não consigo esquecê-la.”

Uhmm. Resmunguei. O que ele tomou como um sinal para continuar a falar já que não me olhava. Tinha os olhos fixos no chão. O corpo um pouco arqueado para baixo e as mãos sobre as penas. A cabeça pendente para baixo, aliás como convém nestes casos.

“Ela é linda. Não é culta. Meio vulgar, meio baixo nível. Mas fazer, né? Eu gosto assim.” E foi falando. “Mas, ela me trocou por sujeito mau caráter. Ele tem estatura mediana, é um sem eira nem beira, um funcionário público qualquer...

Aí o cara começou se a desesperar. E eu só olhando. À vezes dizia “arrã”, outras “hummm”.

E o corno falando: “Ela, a Jacqueline, não sabe o tanto que eu a quero. Ela não podia ter feito isso comigo.”

E eu: “hummm”

O corno: “Até conheci outra garota legal. Esta culta, linda, corpo escultural, perspicaz, fina, elegante e muito inteligente... sabe, uma pessoa boa mesmo. Esta outra mulher até me ajudou num momento difícil. E ela não gosta daquele cara

Sim, porque todos se conhecem. Somos todos da mesma turma”. E não parava. Parece até que as palavras iriam aparar o chifre, pensei.

E ele: “Esta nova mulher até disse que não entendia porque a Jack (a minha amada Jack) estava com este otário.”

Eu tomei coragem e disse ao corno “continue”. Foi para incentivá-lo, pois notei que ele estava ficando envergonhado.

E ele. “Esta outra mulher não sabia que eu tive uma caso com a Jack. Já tinha acabado, claro. A Jacqueline numa bebedeira disse que amava o outro – o mau caráter e galinhão  – disse que o amava que queria ficar com ele. Me senti diminuído.”

“Normal”, entrecortei quando deu uma brechinha.

 Aí o fulano explodiu: "Mas, a primeira me trocou. E eu sou obsessivamente louco por ela. Não sei como ela me trocou por aquele sujeito. Que faz parte do meu grupo de amizades. E eu tenho que conviver com ele. A única coisa que consegui foi afastar ela e a segunda mulher também. Pedi para os amigos não chamarem as duas para sair com a gente. Mas, a verdade é que eu durmo e acordo pesando na Jacqueline”. E desata a falar, o corno.  “Eu que tenho doutorado! E perdi a Jack para um idiota que só saber falar de Harry Potter...”. Não se contendo o corno desaba a chorar...

Como a cena descambava para o limite do ridículo ou para o gravemente patético, criei coragem e disse: "Bem, vejamos. Deixe-me recapitular: você estava com uma mulher de nível mais baixo que o seu, que te trocou por um amigo menos ricos e menos capacitado que você. Ela confessou, no meio de uma bebedeira, para quem quisesse ouvir que gostava do outro. É isto?

- Sim, foi deste jeito. Respondeu, meio sem graça.

E depois você conheceu uma outra garota muito interessante  e compreensiva, linda, de bom nível intelectual e, ao que parece, muito carinhosa com você, certo?

-Exatamente.

E você não quis nem dar nem uma chance a esta nova pessoa. Nem conhecer. Nem mesmo uma chance a você de se permitir conhecer melhor outro alguém?

- É. Bem... quer dizer... sim. Foi precisamente isto que aconteceu. Respondeu o corno, totalmente atabalhoado.

Finalizando, você sai com o cara que ficou com a sua “grande paixão” e se afastou das meninas constrangendo os amigos a escolherem entre pessoas do mesmo grupo. Você fez com que até a menina legal fosse afastada, certo?

Certo. Foi assim mesmo.

Como é seu nome mesmo? Nem deu tempo de perguntar...

Então, Sr. Amarelo, deite de bruços ali naquele divã e relaxe. Respire fundo três vezes e solte. Isso, isso...
Com o rapaz ali de costas eu tirei minha sandália e dei-lhe umas bordoadas. No bumbum.

“Ei, ei doutora que é isso? Que método é esse que eu nunca ouvi falar?” Perguntou o corno assustado.

É o método “tapa no bumbum” que sua mão deveria ter te dado quando você era pequeno. Por que assim talvez, você tivesse deixado de ser um menino birrento apegado aos brinquedinhos. Talvez hoje você não fosse um corno, chorão e bundão.

“Mas o que significa isto? Que tipo de psicóloga é você?”

“Eu não sou psicóloga. A Drª Joaquina é minha amiga. E só começa atender às 10 horas. Estou aqui porque a faxineira dela vinha pegar o pagamento e ela não poderia chegar antes...”

“Mas, eu cheguei às 10 horas! É o meu horário, e...”

“Não, não. Você chegou às nove horas. São dez para as dez. Você não deve ter acertado o seu relógio.Coisas de horário de verão, né!”

E quem é você?

Já disse amiga dela. Na verdade sou publicitária. Você chegou tão desesperado que nem me deixou falar. E aí resolvi escutar seu drama.  Que babaca você, hein? Larga de ser corno, chorão e se arrastar por quem não te quer. Deveria ter se dado uma chance ou pelo menos conhecido melhor a nova garota. Tá sofrendo porque quer. E todo castigo para corno é pouco. E...Oi Joaquina. Que bom que você chegou!

Bom, como você pode ver seu paciente já chegou! Ele se adiantou... Bem já vou indo pra deixar vocês à vontade...  Ah, a faxineira não passou. Depois conversamos. Tchau Joaquina, a gente se fala depois. Amarelo foi um prazer, boa sorte!

E o mauricinho corno lá... com cara de bobo.

(Baseado em fatos reais)