A Revolução das Belas
E como
sempre, com a sexta-feira, chega alguma notícia nova e minha imensa vontade de
abrir um consultório. A Renata se descobriu. E veio me contar...
- Amiga
descobri uma coisa. Quer dizer me descobri.
-Você é gay?
Olha que por esta eu não esperava! Mas, que bom que você está dividindo isto
comigo e ...
- Não é nada
disso!
- Então o
que é? Nesta pressa achei que fosse algo muito interessante a ser revelado, que
até daria uma boa crônica, aliás ando sem inspiração...
- Na verdade
descobri que no fundo, sou muito exigente.
- Aham... E
só descobriu agora? Que bom. Mas, se
tivesse ligado antes eu teria dito. Espero que não tenha gastado 80% do salário
com psicólogo para esta descoberta magnífica!!
- É pode ser
que muita gente já soubesse. Aliás eu também já sabia só que negava. E não
gastei nem um tostão. Observei apenas.
- Menos mal.
E negava por quê?
- Ah, o de
sempre : medo de não ser amada, não ser querida. Todos nós queremos aprovação,
né?
-É verdade.
Queremos ser amados e admirados e idolatrados e...
- Não, não.
Calma. Querer ser idolatrado só você que é artista. Eu não. Aliás posso falar
de mim?
-Sim, claro
continue. E como se deu esta descoberta do século?
- Bem,
depois que eu vi que nada, nem ninguém me interessava por muito tempo fiquei prestando atenção. Aí, foquei
na s pessoas com quem eu saía amigos, ficantes, namorados etc. Até tentei um relacionamento. De uma forma ou de
outra eu sempre ficava com pessoas que eu achava feias ou burras ou de um nível
de entendimento inferior apenas por
achar que elas iriam me achar o máximo e me dar valor, que ficariam felizes em estar
com alguém como eu, mas nunca dava
certo.
- A modéstia
não é seu forte.
-
Infelizmente, não. Mas eu fingia ser modesta, entende? Também fingia que
gostava de todo mundo. E depois eu passei a não suportar mais isto. Passei a
sair com pessoas que se encaixavam em
pelo menos duas ou três exigências. Mas,
ainda era pouco. E elas se tornavam um fardo pesadíssimo para mim. Continuei apenas a sair com estas pessoas para
conhecê-las e a maioria me chateava tanto que não durava um terceiro encontro. Sabe, nem para dar uma satisfação eu
conseguia falar com a pessoa. Era só por mensagem.
- Credo!
Parece que você ficou meio com nojo de algumas pessoas.
- Meio não.
Totalmente. Teve um cara que eu comecei muito a fim dele. Depois alguns
encontros e coisas que ele disse e até gestos passaram a me incomodar. E eu fui listando
tudo. Aí minha ficha foi caindo e eu passei a detestá-lo. Hoje só o quero
bem longe assim como outras pessoas: não
quero nem bem, nem mal. Só distância.
- O que este cara tinha de tão ruim?
- Ah, meio
chato falar, mas ele não tinha o status que eu gostaria. Apesar de uma situação
financeira confortável. Mas , isto era o de menos. Comecei a achá-lo bobão, sem graça, feio
cheio de defeitos. E sim passei a admitir que a estética fazia diferença para
mim. Antes eu ficava com vergonha de mim por não dar chance a pessoas que eu
considerava feias. Ficava me forçando a ser compreensiva e legal. Eu não sou
assim. Eu não sou tão desapegada.
- Nossa
então você se descobriu interesseira e superficial?
- Não, nada
disso. É por conta deste tipo de reação que eu ficava me escondendo.
- Desculpe.
Termine o raciocínio.
- Não é
isto. Eu assumi que gosto de coisas boas, lugares elegantes e viagens. Não
preciso de ninguém para bancar isto para mim. Só que quem estiver comigo tem
que Mem acompanhar. Outra coisa: gosto de homem bonito sim. Pra que mentir e
ficar com pessoas que não me dão tesão? E acima de tudo: gosto de pessoas
descoladas e com cabeça aberta, que não sejam estes imbecis que tem hora para entrar e sair do trabalho,m
e que não tem nenhuma criatividade, que tem sua vida pré determinada por conceitos
e valores dos avós...Argh, isto enche o saco. Daí me vem um tédio, uma vontade
de chutar o pau da barraca...
- Nossa!
Realmente tinha outra pessoa dentro de você que estava bem abafada.
- É. Mas,
agora eu resolvi isto.
- Como?
Agora também quero soltar meu verdadeiro eu, minha sombra, meus aspectos
escondidos, o ego , o Id ou sei lá como se chama isto!
- Vai rindo!
Mas, mas entendo seu não-entendimento (é virei inclusive filósofa de almanaque).
Fiz assim: cortei todas as pessoas que eu considerava amigas, mas no fundo eram
apenas um suporte para eu poder sair e bater papo, mas que na verdade eu
considerava muito chatas e bobas, dei foras homéricos em mais de um cretino que não
eram nada e se achavam a última bolacha do pacote e, por fim, resolvi conviver com a solidão.
-Mas quem
disse que você vai ficar sozinha?
-Ué se eu
resolvi deixar meu nível de exigência nas alturas...
- Bem isso
lá é verdade. Depois de tantas concessões que você fez...eu lembro daquele
gordo horroroso e daquele velho esnobe e falido...
-Por favor
não lembre disso. Eu dei pérolas ao porcos e me arrependo muitíssimo. Foi tempo
perdido. Era uma fase de baixíssima auto-estima. E eu nem lembro bem da cara
destes sujeitos. Foi erro. Mas eram apenas pobres coitados.
-
C-a-r-a-m-b-a!!!! Tô bege. Quanto desprezo.
- É pode ser frieza, desprezo ou maturidade. Não
sei. Só sei que nada disso me interessa
mais. A maioria das pessoas que eu
conheci no passado é como se estivessem mortas. É uma coisa estranha. Como se
eu tivesse acordado de um transe. E daí que tenho novidades!
- Será que
eu aguento mais coisa?
-Vamos
comemorar hoje a noite? Estou de mudança! Consegui uma emprego em Nova York, em
outra agência de publicidade.?Madei curriculum e aprovaram! Aproveitei e pedi
demissão da agência que me pagava mal e ainda achava que era um favor me dar o
emprego. Também cortei o cabelo.
- Amiga, que
acelerada! Oba! Já tenho onde ficar em Nova York! Isso é que é chutar o pau da
barraca. Gostei. Agora me deu vontade de cortar umas pessoinhas também e assumir umas características que acho
que são defeitos... Enfim, vamos logo tomar este Jack Daniels antes que você
enjoe de mim também e eu perca a vaga de hóspede da sua casa.
- É isso! Você
disse tudo! A palavra é enjoar. Enjoei de tudo isso. Acho que to grávida de uma
vida nova!! E quem sempre se achou por cima, na verdade eu não estava nem aí.
Enojei ou enojei de muita gente.
Principalmente de suas mentalidades tacanhas e sem graça que me causavam apenas
tédio e sufocamento. BASTA! É a minha palavra de ordem.