terça-feira, 19 de abril de 2011

A Mesa






Sabe aquele poema do Carlos Drummond de Andrade “No meio do caminho tinha uma pedra, tinha uma pedra no meio do caminho (...)”? Pois é. No meio do meu caminho tinha uma mesa. Não, não. Não é nada metafórico, filosófico ou junguiano. É um objeto mesmo. Velho e pesado.
Ele lá e eu cá. E uma PQP de uma mesa no meio. Olha, eu queria dar um chute na mesa e agarrar ele. Ou melhor, queria subir na mesa bem devagar, passar as mãos na nuca dele, sempre olhando bem fundo nos olhos, começar beijando bem devargazinho no pescoço, deixar as mão percorrer os braços dele e beijá-lo na boca com furor...
Eu inspirada sou ótima! Ganho elogios falados e escritos (Sim! já fui musa inspiradora e conservo uns poemas de certa qualidade). Enfim, ele nem sabe o que perdeu. Talvez perceba o que ainda vai ganhar porque tem uma coisa inexplicável no olhar. Um mistura de vontade ardente com medo apavorante. Excitantíssimo!
Situação estranha. Enquanto ele pensava e falava e dava dicas e idéias sensacionais eu estava lá entre a admiração e o tesão.  E aquela mesa horrorosa nos embarreirando.  Tem mulher que gosta de homem rico, outras de homens engraçados e outras ainda, de cafajestes. Eu – que gosto de abundância – tenho logo duas preferências: homem inteligente e bonito. Nesta ordem. Detesto burrice e falta de visão. Me dá gastura. Uma vontade louca de sair, largar tudo e ir embora (Atenção: nunca tente prender um ariano! Não tente ‘engarrafar’ o fogo que é perda de tempo. Dê lenha para queimar que é melhor. O fogo fica ali quietinho só aquecendo...)
Eu vou parafrasear outro poeta:
“Os burros que me desculpem mais inteligência é fundamental”.
E é mesmo. É afrodisíaco!  Uma vez, sem querer, falei para o então namorado (bonito e burro): “Eu tenho medo deste seu pensamento classe média. Veja bem não estou falando de dinheiro ou de posição social. Estou me referindo ao modo de encarar a vida, de visão de mundo...” O belo quase caiu da cadeira. Não entendeu nada, mesmo assim continuou comigo. Creio que é porque eu falei a verdade. Eu gosto da verdade. É um dom dizer a verdade.
Voltando ao inteligente (e charmoso). Acho que ele não tem certeza que eu sinto este desejo louco por ele. Se bem que um dia (acho), dei bandeira. Há muito tempo eu realmente não prestava muita atenção nele fisicamente. Gostava mais de sentir a energia e perceber o que ele dizia com o olhar. Neste dia, entretanto, eu me perdi olhando para os detalhes do corpo e rosto do querido. Fiquei deliciada ao perceber que o cabelo dele estava lindo, a pele, a boca... tudo harmonioso. E a voz? Adoro aquela voz. Enfim, ele estava demais. Confesso, permaneci extasiada por horas. E quando digo atenção aos detalhes é muita atenção e muito detalhe mesmo. Até na unha eu reparei. Eu já pintei quadros. Tenho olhinho treinado. Posso descrever estes detalhes. Descobri até uns fios de cabelo branco a mais. Gostei. Ele emagreceu um pouquinho, mas continua com uma barriguinha. Gostei também. Descobri que não pega bem usar salto perto dele. Não importa.
Note-se que aqui há um desvio de padrão. Há um bom tempo tenho dado preferência aos garotos. Homem, homem de verdade é mais complicado. Há sempre um risco. Todos os que vocês imaginarem aí fica no parênteses imaginário que abro no texto. Ou seja, um verdadeiro inconveniente. Contudo, entre adultos inteligentes sempre tem jeito. Eu definitivamente acredito que conversando a gente se entende. Assim, de repente surge um contrato, como aqueles explicados por Rousseuau e fica tudo certo.
Voltando ao dia do êxtase dos detalhes: Gostei da camisa, do cinto, do sapato. Estava tudo muito elegante. Viu que difícil agradar? Este agradou. Pelo que me lembro só duas pessoas me agradaram assim antes na vida. E claro, tem uma energia que rola. Como posso descrever... É descarga elétrica misturada com sensação de calor... Acabaram os poetas a serem copiados... Ah! Vamos de Eça de Queiróz (amo realismo):

"(...) sentia um acréscimo de estima por si mesma,
 e parecia-lhe que entrava enfim numa existência superiormente interessante,
 onde cada hora tinha o seu encanto diferente, cada passo conduzia um êxtase,
 e a alma se cobria de um luxo radioso de sensações!" *


Espero que tenham compreendido a sensação. Eu não seria capaz de descrever tão bem quanto o genial português.
Esta semana passou na TV aquele filme antigo que o cara começa a escutar o que as mulheres pensam. Imediatamente me lembrei de nós dois conversando. Se ele escutasse o que eu pensava acho que ficaria ‘motivado’. Depois confuso. Porque eu pensava coisas sérias e ‘quentes’ (beeeeeeeeeeeeem quentes) ao mesmo tempo. Sem graça ele não ficaria não porque tem cara de quem gosta do “negócio”. Aliás, pelo signo dele, gosta e gosta muito. Mas não se enganem: não é elemento fogo! Terra tem lá seus encantos...
Mas, ele tem que dar um jeito.  Ou tira aquela mesa ou conversa comigo no sofá, ou no bar, sei lá. Porque eu tenho imaginação, mas ação não é bem a minha praia. E se ele dá início... ah! Vai gostar destas ‘cositas’ imaginadas... Ô se vai!!!!!!!!!!!!!!!
Querido, tira as coisas do caminho. As reais e as convencionais.
Vem brincar com fogo!


 * O Primo Basílio (1880)

** O vídeo abaixo parece ruim, mas é melhor para a finalidade. 


 


domingo, 17 de abril de 2011

Intimidades...




“De dinheiro, mas não dê intimidade” – ditado mineiro.

Domingo. Quase uma da tarde. Valéria na cozinha fazendo macarrão. Também tentando curar uma ressaca sem precedentes. Entra no ‘namorido’*
– E então você acredita mesmo que o gosto musical pode ser um empecilho para um relacionamento.
– De novo isto, Pedro? Claro que sim. A música diz muito sobre a personalidade e o modo de vida da pessoa. 
– E você continua achando que o ‘Roupa Nova’ é muito brega e tem CERTEZA que este foi um dos motivos para gente não começar a morar junto ainda este ano. Confirma?
– Ah!Entendi aonde você quer chegar. Sim, confirmo e reconfirmo. “Tã, tã, tã bati na porta, não precisa ver quem é...” me poupe. Aliás, me admira muito um historiador, um intelectual escutar, mesmo que de vez em quando, ‘Roupa Nova’. Sinceramente... eu sinto vergonha alheia. Aqui em casa este lixo, não entra. Nem tente colocar isto no meu notebook. Vai contaminá-lo. Nem tente...
– Não, não quero escutar nada não. Então, você continua afirmando que estas “coisas” como você diz e comédias românticas e apelidinhos carinhosos são artefatos sentimentalóides originados das novelas brasileiras que infantilizam e imbecializam os casais e ...
– Ô Pedro, eu quero terminar nosso almoço pode ser? Confirmo tudo. Isto tudo é uma babaquice sem fim.  Por favor, traga-me novidades.
– Pois, não! A pedidos: você pode me dizer o que significa ISTO?
De repente o namorido, com um ar altamente triunfante mostra à Valéria uma pastinha marrom, bem velha, destas com plásticos dentro. Cheia de documentos antigos...
– MINHA COLEÇÃO DE POSTERES E ALBUNS DO MENUDO!!!!!!!!!!!!! COMO? ONDE VOCÊ ENCONTROU ISTO?
– Arrá! Então, o que você tem a me dizer sobre isto, minha cara?  Menudo, hein? Logo você! Quem diria... e aí? E aí? Falsa intelectual.  Agora estou curioso. Qual era seu Menudo preferido? O gay?
– Não. Era o Ray. O loirinho. Você sabe, né eu gosto de um branquelo e... Peraí, peraí. Que que é isso? Como você encontrou minha coleção?
– Embaixo da cama. Resolvi te ajudar, fui dar uma faxina. Fui mudar o colchão de lado e daí avistei este objeto não identificado. Logo quem... tsc, tsc, tsc.  Tá pálida, amor! Que foi? Você também tem um lado brega? É isto? Relaxa. É normal.
– Pedro Augusto, tira este risinho do rosto já! Eu era uma criança. Tinha 11-12 anos. Não tinha discernimento.  Meu lado brega usa Prada! Musicalmente, eu sou um ser superior. Ao contrário de você que é um falso intelectual. Você sim é ridículo. Com tanta coisa boa para escutar prefere coisas trash. Eu não fico escutando Menudo por aí. É passado.
– kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk. E porque você ainda guarda estas bugingangas? Vai lá, ‘ não se reprima’! Pode colocar um LP do Menudo na vitrola. Só ressalto que o ‘Roupa Nova’ tem CD.
– Se eu quisesse escutar Menudo eu não me reprimiria mesmo e baixaria tudo pela internet, seu jurássico. E este assunto está muito interessante, mas você vai dormir na sua casa hoje. Pra ver se pára de ser enxerido. Tchau.
– Ih! Apelou perdeu. Saiba que “eu quero ser o amigo que está sempre em seu caminho...”
– Cretino! Você leu. Esta era a música do Ray. Isto é uma invasão de privacidade. E na minha própria casa! Quanta ousadia. É por isso que eu não quero morar com você. Isto é um desrespeito, um absurdo...
– Absurdo é alguém guardar a prova do crime.
– Que crime? Guardar uma lembrança de criança. Aliás, isto deve ter sido coisa da minha mãe. Ela deve ter feito uma faxina viu isto e trouxe para cá. Só pode ser isto. Eu nem lembrava que isto existia.
– Querida, não fica deste jeito. Não precisa ficar nervosa. Eu te amo mesmo assim! Tu és um chica mui guapa!
– Pedro, some da minha frente. Agora.
– Tá bom. Tá bom. Não se fala mais nisso. Eu vou até recolocar “os documentos” no lugar. Desculpa ter lido algumas partes. Mas, que você tem lado brega, ah isso tem. Igualzinho a mim. É como na música do 'Roupa Nova':
“É! Talvez eu seja simplesmente
Como um sapato velho
Mas ainda sirvo
Se você quiser
Basta você me calçar
Que eu aqueço o frio
Dos seus pés...”
Enfim, Val, admita: eu sou a pessoa ideal pra você! (Pedro com sorrisinho de supremacia absoluta).
– ‘Roupa Nova’ não! Some daqui Pedro. Realmente você não vale um sapato velho. Desaparece.
– Saio não. Por este motivo, não. Você precisa melhorar este humor. Vamos escutar Chico Buarque, dar uns beijos, fazer umas coisas legais. Que tal? Tem um monte de coisas que sei eu você gosta e que eu sei fazer muito bem! Aí você fica tranquilinha. Vai perder o domingo? Você nem assiste futebol. E domingo é um tééééééédio. Aproveita a oferta. Eu, ao som do Chico. É pegar ou largar.
– Tudo bem,fica. Mas, dorme no sofá. Já foi muita intimidade para um dia só.  

* Namorado que dorme na casa da namorada no meio da semana e sagradamente, nos finais de semana. Faz algumas coisas de homem como abrir potes de conserva, trocar a lâmpada e matar baratas.